terça-feira, 17 de novembro de 2020

A morte bem próxima

Não há absolutamente nenhum fenômeno capaz de nos fazer repensar toda a vida passada, presente e futura do que a morte de alguém próximo. Tudo passa a ser relativo e muitas certezas passam a não existir mais. 

A pergunta, eternamente sem resposta, fica suspensa no ar: e se não houver amanhã?

Após a morte da Teresa, uma apreensão tomou conta de mim. Pela Patrícia, em primeiro lugar, e depois por mim mesma, sabendo que o mesmo pode acontecer com meus pais, meus sogros, minha tia. 

É normal, é natural, mas ninguém está preparado. E se não houver tempo para o último beijo? Para as últimas frases? Espera, tínhamos planos para o fim de semana! E agora?

Lembro sempre da minha avó, que morreu no intervalo entre descobrir que seria bisavó e o nascimento da Joana. São tantas as palavras nunca ditas, tantas alegrias não vividas que a dor volta como anos atrás, como se nunca houvesse realmente partido.

E eu, que estava com tanta preguiça de ir na Boiuna na sexta-feira, estou mais certa do que nunca. E se não houver sábado? Bem, pelo menos o dia anterior terá existido e ali saberei que houve amor.

No fim, é mesmo a única coisa que resta. Saber que fomos amados é a única sensação acalentadora no meio do desespero. Lembrar de palavras carinhosas e olhares amorosos será sempre um afago quando a saudade aparecer. 

E ela aparece, sempre.

A dor da perda futura existe e eu sinto há anos. Quando uma morte como a da Teresa acontece, a dolorosa pergunta volta à minha cabeça: quanto tempo será que vai demorar para ser você aqui no lugar da Patrícia?

Hoje o coração está apertado, com tristeza pela perda da minha irmã de coração, e por saber que esse meu amanhã chegará. Se Deus quiser, que entre hoje e esse amanhã haja um intervalo muito longo. 

ACL

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Compulsão, uma amiga próxima

Sei que a minha compulsão alimentar vem das restrições que sofri na infância.

Comer sempre foi um martírio e, por isso, mantenho  uma relação estranha com a comida. 

Sempre disse que, quando tivesse a minha casa, tudo seria mais fácil. Eu poderia cozinhar a minha própria comida, compraria o que bem entendesse, congelaria várias receitas saudáveis e um mundo melhor (e mais magro) me aguardaria.

Aqui estou, aproximadamente 18 meses depois de estar instalada na minha cada, e o corpo que possuo não é mais leve do que no início dessa jornada: pelo contrário.

É claro que a quarentena forçada dificultou muitas coisas, mas sei que a grande parte dos problemas são internos. 

Além de comer forçada, na maioria das vezes alimentos que eu não queria, havia o dinheiro restrito e as poucas chances de comer as guloseimas que queria, no tempo e quantidade desejada.

A liberdade do trabalho, no início, foram o gatilho para a compulsão alimentar. O fim daquele longo relacionamento atrapalharam mas o metabolismo rápido dos primeiros 20 anos foram fundamentais para processar tantas calorias ingeridas em poucas horas.

Conforme a liberdade financeira foi aumentando, a "libertinagem" alimentar foi aumentando e, com isso, o peso também. A frustração do corpo nunca voltando para o mesmo parâmetro do início dos 20 anos foram um peso enorme nesse processo de afundamento.

É engraçado pensar que, ao contrário do que imaginei, a liberdade de ter a minha casa fez com que eu me enterrasse de vez nas más escolhas, ao invés de nadar de braçada nas boas.

Tentei academia, nutricionista, conversa com o marido mas, quando estou sozinha em casa ou na  praça de alimentação do shopping, só existe o diabinho falando no meu ouvido.

Hoje, dentre diversas possibilidades, cozinhei um risoto. Não seria absolutamente nada demais, se o restante do dia fosse feito de escolhas saudáveis e sensatas, mas o gatilho da palavra "hamburguer" e a frustração do corpo ""disforme"" foram mais fortes. Comi um hamburguer, batatas fritas, Coca-Cola e ainda devorei uma caixa com 12 brigadeiros, que eu deveria dividir com o amor da minha vida.

Mais uma vez estou triste, me sentindo para baixo e derrotada. É como se a comida tivesse ganho e, nessa batalha, eu não tivesse a menor chance. 

Não vou dizer que amanhã será um novo dia, pois ainda é cedo. Hoje será uma "nova noite" e farei o meu melhor para que amanhã seja um dia muito melhor.

ACL